sábado, 23 de agosto de 2008

LP WALTER CARLOS E THE WELL-TEMPERED SYNTHESIZER 1970 CBS




LP WALTER CARLOS E THE WELL-TEMPERED SYNTHESIZER


1970


CBS MASTERWORKS
160168



“A realização de Carlos do Quarto Concêrto de Brandenburgo é, falando francamente, a mais bela execução de qualquer um dos concertos de Brandenburgo que já ouví – ao vivo, gravado ou que teria imaginado”
Glenn Gould


Algo estava errado. “Switched-On Bach” pretendia ser uma experiência artística, um meio de pesquisa e ensaio, exemplo de um compositor contemporâneo procurando encontrar-se – e não o marcante sucesso comercial em que indiscutìvelmente se transformou. E, um ano depois, eis-nos com a responsabilidade da seleção do material para o disco que lhe daria continuidade. Walter desejava tentar a orquestração de uma obra ambiciosa do século 19: entretanto, recursos insuficientes em ralação a número de faixas de som, não o permitiam. Por outro lado, realizar um trabalho de autoria do próprio Walter, parecia um pouco prematuro, sendo preferível deixa-lo para um próximo ano. A solução surgiu, finalmente do próprio entusiasmo do público por mais trabalhos eletrônicos com obras de Bach, e o resultado é êste novo disco barroco. “Que está a venda na Tienda Café Con Che”.
Mas nem tudo saiu bem. Vários críticos, muitos músicos atentos ao nosso trabalho, e apreciadores de música, começaram a indagar: “Como o moog consegue fazer tudo isso?” - dando a entender que o aparelho era de certa forma, o responsável pelos níveis artísticos e de criatividade do nosso “Switched-On”, que tanto sensibilizaram aos que o ouviram. E assim, perpetuou-se o mito, que criou a singular situação em que hoje nos encontramos: um piano Steinway recebe muitos aplausos pela apresentação, do ilustre Sr. Horowitz (ou até mesmo, do Sr, Gould)
Contudo, a esta altura dos fatos, o sintetizador, na realidade, não é mais que um embrião. Assim, como os pioneiros da música eletrônica firmaram-se utilizando o que havia na ocasião, Walter vem prosseguindo – dentro das limitações da atual aparelhagem (e, infelizmente há muitas) - no trabalho de introduzir no mundo musical o seu meio de expressão ( a música eletrônica), sem ligá-lo a um estilo exclusivo (contemporâneo, aleatório, serialismo, etc.). E Walter está, inegavelmente, capacitado para uma tarefa de tal dimensão, pois nêle estão mesclados os talentos de compositor, intérprete, regente, projetista-construtor de instrumento, afinador de piano, técnico em acústica, engenheiro de gravação – e trabalhador incansável.
Acredito que a presente gravação apresente mais um passo na afirmação dêsse mais nôvo meio de expressão musical. Aqui, as esmeradas interpretações, em nada deixe transparecer o tempo e trabalho cansativo necessários à sua realização. Passei horas e horas, observando atentamente como, nota após nota, frase após frase, aquela música conhecida ressurgia em uma nova forma e peculiar. Mas, será que Bach precisava disto? E agora, Haendel, Scarlatti e Monteverdi? É claro que não. Mas, levando em consideração as execuções geralmente apáticas, limitadas e sem interêsse – pelo motivo mesmo, de nada apresentarem de nôvo – que já estamos habituados a ouvir em salas de concêrto e em discos, é pelo menos reconfortante, como experiência (a despeito do purismo, e do fator eletricidade), a exuberância e emoção de Walter transmite em suas execuções/realizações/orquestrações.
Uma palavra final sobre Carlos. Inicialmente êle era um físico, que se contentava em escrever óperas e quartetos de cordas, para deleite próprio e de amigos mais chegados. Mas, novamente aí, nem tudo saiu bem.
Rachel Elkind
Produtor.

A música deste disco é constituída de fieis transcrições/execuções de obras de Bach, Haendel, Scarlatti e Monteverdi. Os estilos polifônicos e dramáticos, barroco e pré-barroco, parecem-me perfeitamente adequados a esta forma de expressão musical.
As duas peças de Monteverdi são de estilos semelhantes. Ambas, tentei imprimir sonoridades imponentes e vibrantes, e os coloridos análogos foram intencionais. O Coral “Cantus Firmus” em “Domine Ad Adjuvandum”, representa uma primeira tentativa, de preencher os intervalo entre as partes vocal e intrumental, sendo constituído por alguns dos mais complexos sons que já obtive no atual sintetizador. As articulações vocais – imitativo ou característicos de vozes – exigiram uma cuidada afinação de quase todas as modulações do sintetizador, e tornaram-se possíveis, graças a uma exercitada coordenação de pés e mãos, de modo a separar a altura, vibrato, intensidade, portamento, e duas ressonâncias emissoras de vogais; cada uma das modulações foi regulada para obter o máximo de expressividade nas seis partes vocais: Soprano I, II, Contralto, Tenor, Barítono e Baixo.
As quatro Sonatas de Scarlatti são completamente diferente de tudo que já fiz. Como são formadas por um contraponto e duas vozes, raramente composto de mais de três ou quatro vozes, pensei numa execução linear com um sentido único – distinta ou relacionada – em que cada voz poderia ou não, ser especìficamente de efeito musical. Dêste modo, tentei fragmentar cada parte dentre muitos coloridos, semi-pontilhìsticamente, conservando entretanto um “feeling” global básico, nos vários fraseados e vozes principais. A Sonata em Ré Maior, L. 164, foi a primeira que fiz, e é a que contém o mínimo de fragmentação. A Sonata em Mi Maior, L. 430, é talvez o exemplo mais trabalhado da referida fragmentação, e ao lado da Sonata em Ré Maior, L. 465, mostra o rápido processo de mudança de colorido e estereofonia – tão próprio e viável no meio eletrônico – conquanto conserve-se fiel ao espírito original da obra.
As três partes da “Música Aquática” de Haendel são bem diversas entre si. A Bourré é aparentemente simples, e consiste de duas tessituras, relacionadas, mais distintas. Aqui, interessou-me a expressividade semelhante à de piano. A “Ária”, por outro lado, é mais instrumentalmente expressiva. E extrapolada em estilo, de recente prática de execução. Não é preciso dizer que gostei muito de fazê-la. A “Allegro Deciso” é totalmente orquestral, e tomei pequenas liberdades quanto à forma e à orquestração, como também fiz com a “Ária”.
O Quarto Concêrto de Brandenburgo foi composto por Bach para três instrumentos solistas – um violino e duas flautas – embora o solo de violino sobressaia muito mais e seja mais apurado, e um “ripieno” de orquestra de cordas usual, e continuo. Em minha interpretação, resolvi dispor êstes três elementos da seguinte forma: as partes de baixo e cravo, possuem timbre semelhante do principio ao fim, com expressão suficiente para aparecerem nas seções “tutti”, sem no entanto tornaram-se demasiadamente dominantes. O violoncelo é um pouco mais colorido, dependendo do seu papel: as três cordas superiores são harmonizadas nas partes homofônicas, ou contrastam claramente entre si em passagens polifônicas; embora permaneçam claramente homogêneas em relação ao conjunto. Os solos de flauta são bàsicamente realísticos/imitativos, mas nem sempre, e aí, eu tinha em mente o colorido da antiga flauta doce, exceto quando uma flauta moderna (travessa) e flautim, pareciam mais apropriados. No segundo movimento, foi acrescentado um “sussurro branco”. A parte de solo de violino – exceto quando ela se junta as seções “tutti” - recebeu um tratamento completamente diferente, de modo a realçar seu papel de solista, e foi baseado no principio utilizado nas Sonatas de Scarlatti. Não fiz tentativa alguma de imitar a sonoridade de qualquer instrumento existente, apesar de terem-se apresentado oportunidades tentadoras na parte final, de assim garantir solos, acompanhamentos e o equilíbrio da orquestra. Como em Monteverdi, e algumas obras de Haendel, fiquei preocupado com que, ao final do trabalho, se apresentassem amplitude e profundidade, típicas das chamadas apresentações ao vivo; por isto, desenvolvi muitas técnicas híbridas de reverberação de som. Os andamentos e fraseados refletem preferências pessoais, inspiradas nas interpretações modelares dêste Concêrto, que me sensibilizaram durante muito tempo.
Walter Carlos.




Tienda Cafe Con Che
Porque é Imprescindível Sonhar

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