quinta-feira, 1 de novembro de 2007

LP / VINIL ANDRE DA SILVA GOMES / JULIO MEDAGLIA SAO PAULO SEC XVIII



LP SÃO PAULO SÉC. XVIII

FESTA
IG79501
1970

Quando em fins do século XVI, Domingos Luis, o "Carvoeiro", trasladou, para as proximidades do riacho Guarape, a capelinha de Nossa Senhora da Luz, que outrora se erguia no Piranga, não poderia imaginar o futuro papel que a construção, pequena e modesta, representaria dentro da vida paulistana.
Ninguém poderia sonhar qualquer outro destino para a ermida em que se transformou o pequenino templo e os dois cômodos vizinhos, após a morte do "Carvoeiro".
Quando Frei Antonio de Santana Galvão, em 1774, sob o Governo de D. Luis Antonio de Souza Botelho e Mourão, Morgado de Mateus, "iniciou" no mesmo local, a edificação do Recolhimento da Luz e da Igreja de Nossa Senhora da Luz, imaginou fazê-lo tão somente numa ostensiva, demonstração de fé. Esse ato de fé assumia um simbolismo, muito significativo no projeto da torre, somente concluída depois da morte de Frei Galvão, ocorrida em 1822.
Mas, para o Governo do Estado de São Paulo, na administração do DR. ROBERTO COSTA DE ABREU SODRÉ, o velho Recolhimento da Luz assume, antes de mais nada, um profundo sentido de fé na gente paulista e na nossa Cultura, cujas raízes nos sobem do período Colonial.
Através do Museu de Arte Sacra de São Paulo, preserva se um dos mais preciosos veios de nossa Arte Religiosa e colonial, ela própria uma rica manifestação de brasilidade.
A idéia de localizar no Recolhimento da Luz o conjunto de obras de arte religiosa de inicio mandadas recolher por D. Duarte Leopoldo e Silva e guardadas no edifício da Cúria Metropolitana – onde não tinha condições de exibição ao publico – partiu de entendimento havido entre o Coodernador da Reforma Administrativa de São Paulo, Luis Arrobas Martins, Secretario da Fazenda, e D. Agnelo Rossi, Cardeal-Arcebispo de São Paulo, entendimento esse logo prestigiada pelas autoridades competentes do Estado e da Igreja, entre os quais seria de justiça mencionar o Dr. Orlando G. Zancaner, Secretario de Cultura, Esportes e Turismo, que determinou ao Conselho Estadual de Cultura desse todo o seu apoio à reforma da ala antiga do Recolhimento para que nela se instalasse o Museu de Arte Sacra de São Paulo. O Conselho Estadual de Cultura não só conduziu a reforma e a instalação com o também mandou fazer o presente disco, comemorativo da inauguração, com a Missa do Padre André da Silva Gomes, que a compôs em São Paulo em 1871. É a primeira gravação que se fez dessa Missa, da maior importância para a Historia de nossa cultura, executada publicamente, também pela primeira vez, na própria cerimônia inaugural do Museu, na Igreja Nossa Senhora da Conceição da Luz, no dia 28 de maio de 1970.
O AUTOR E A OBRA
O Autor
André da Silva Gomes, quarto mestre de capela da Sé de São Paulo, nasceu em Lisboa em dezembro de 1752, como consta do assento de batismo realizado na Freguesia de Santa Engrácia daquela cidade, sendo filho legitimo de Francisco da Silva Gomes e Inácia Rosa.
A documentação portuguesa não nos forneceu nenhuma trilha acerca do local ou país onde André tivesse desenvolvidos seus estudos iniciais. Chega ao Brasil bastante jovem, com 20 anos de idade, e as condições de sua formação cultural e musical permanecem inteiramente ignoradas. O certo é que seu progresso técnico, após a chegada a São Paulo com o terceiro bispo, Dom Manuel da Ressurreição, em princípios de 1774, é flagrante ao compararmos as suas primeiras composições com a presente obra, de aproximadamente 1785-90. O período áureo da produção musical em São Paulo colônia coincide com as atividades de André da Silva Gomes na Sé. Seu brilhantismo e nível artístico absorvem, sem concorrências – o que apresenta um quadro sui generis – os serviços musicais mais importante da Capital como os da Sé, Câmara, Irmandades do Santíssimo Sacramento e do Carmo. Sua obra, porem, realiza-se sobre pobre contexto técnico-musical historicamente acumulado, ausente categorias numerosas de músicos profissionais, cantores e instrumentistas. Cantores adultos são formados e utilizados no culto somente com André e são geralmente sacerdotes e seminaristas. Antes dele, seu antecessor no cargo, Antonio Manso da Mota, proveniente da Bahia, já dedicara seus momentos a edificação de um substrato ate então modestos lecionando meninos, "aprendizes da Solfa", intuindo que em São Paulo, ausente do meio o elemento musico, jamais se superariam as limitações que obstaculizavam a expansão e o desenvolvimento da arte musical. Antonio Manso provinha de Portugal e em São Paulo desenvolve o ensino mantendo agregados e adotando inúmeras crianças que inicia na arte musical, sendo por eles assessorado, secundado e substituído. Sua vida e trabalho em São Paulo prolongam-se de 1774 a 1823, datando deste ultimo ano sua composição mais recente por nós descoberta dentre mais de centena do acervo da antiga Sé. Incompatibilizara-se sua estilística com um meio impregnado das inovações do bel-canto e da facilidade rossiniana. Mas é certo que obras suas continuam a ser executadas e recopiadas sem solução de continuidade até adentrado o século XX.
André da Silva Gomes faleceu ao 18 de junho de 1844, com 92 anos, após vinte e um anos de vida reclusa.
A Obra
A descoberta, a restauração e edição desta obra é um trabalho de complementação a nossa tese de doutorado "A Musica na Matriz e Sé de São Paulo Colonial", onde é abordada a historia musical naquele templo até a época da independência política do Brasil, processo que culminou com o desempenho, no mestrado de capela, de André da Silva Gomes.
O protótipo usado para a restauração desta Missa, composta de Kyrie e Gloria, de aproximadamente 1785, é um manuscrito original autógrafo da qual não foi encontrada nenhuma copia, contemporânea ou posterior. Os solos nela contido parecem ter sidos executados, a época, com mais freqüência do que o restante da obra, dada a figuração externa das partes.
Ressaltemos nela o cultivo do estilo contrapontístico (Kyrie II, fuga a 8 vozes; Cum Sancto Spiritu: fugato), a rigor da escritura alternada de dois coros (Gloria e Domine Deus) e o tratamento instrumental concebido não apenas como mero reforço tímbrico e de mantenimento das partes vocais; a riqueza harmônica, inclusive na exploração de retardos e antecipações atrevidos (Et in terra). O continuo caminha de forma barroco – cifrado abundante – mesmo que em momentos esteja o baixo de Alberti para conferir a escritura uma natureza galante acompanhando a cantabile. A presença dos trompetes é valorizada discreta e eficientemente na textura, conferindo a peça um barroco brilhantismo. A riqueza melódica e até exuberante (Laudamus, Qui tallis, Quoniam) e, a par da contrapontística, confere a obra grande variedade, secundada pela variação tonal das unidades. A alternância de caráter (Christe entre os dois Kyrie, Gratias, largo, seguido pelo Domine Deus, caminhante, vivo.entusiástico, por sua vez seguido pelo lânguido e "troppo afectuozo" Qui tollis), integra-se também na exploração timbrica das vozes onde os baixos tem destacado desempenho. Aquela alternância esta presente da mesma forma em certas seções em que a dinâmica e articulação são manuseadas com muita imaginação e efeito.
Não podemos fundamentar documentalmente nenhum eventual intercambio de André com compositores e obras brasileiras da época; sua estilística mesmo, não parece haver sofrido deles influencia. Se tentarmos sua integração em grupos e/ou tendências estilísticas, trata-se de realizar analises exaustivas, a que vivemos procedendo, sem o que arrisca-se de superficialidade. Entrementes, ao publico definição e consagração.

ORQUESTRA "CORDAS DE SÃO PAULO"
CORO "VOZES DE SÃO PAULO"
REGENTE: JULIO MEDAGLIA
ANDRE DA SILVA GOMES

(1752-1844)
(Mestre de capela da Sé de São Paulo – Brasil)
"MISSA A 8 VOZES E INSTRUMENTOS" (c. 1785)

Lado Um
KYRIE I, moderato
CHRISTIE, andante
KYRIE II, fuga a 8
GLORIA I, allegro
ET IN TERRA, un poco largo
GLORIA II, allegro

Lado Dois
LAUDAMUS, amoroso
GRAFIAS, largo
DOMINE DEUS, allegro
QUI TOLLIS, troppo affettuoso
QUONJAM, larghetto
CUM SANCTO SPIRITU, fugata

Nenhum comentário: